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sábado, 4 de fevereiro de 2012

Agora que estou aqui, como uma atriz que entra em cena sem ter ensaiado, me ocorre que eu deveria ter pensado em alguma coisa, escolhido melhor as palavras e até ensaiado algumas vezes de frente para o espelho caso tivesse sido possível. Mas você sabe como são essas coisas. Ou pelo menos tem cara de saber. Como é mesmo que se diz? Ímpeto. É essa a palavra. Ímpeto. Sempre gostei da sonoridade desta palavra – ímpeto. Foi assim. A vida nem estava assim, como se diz, complicada. Não, não estava. No bar, era só eu me cuidar, me esquivar dos bêbados e servir-lhes o que me pedissem. Bastava. Era simples. Desde que não me colocassem a mão e, no banheiro, acertassem o buraco daquele vaso, me daria por satisfeita. Iria vivendo. Sobrevivendo. E isso bastava. E no fundo é o que todo mundo quer. É o que eu queria. Ficar por ali, como sempre estive. Os copos eu até gostava de lavar e eram muitos. Eu não me importava. Nem de lavar os copos e tão pouco esfregar o chão. Mas o banheiro – pior: o vaso! Ainda faltava aquele objeto sujo. Mais sujo do que o normal. E meu coração saltava pela boca. Não pelo vaso, mas por aquele cartão, no bolso do meu avental. Nome, sobrenome, endereço e telefone fixados. Ímpeto. Sempre achei o som desta palavra muito bonito sem saber que na verdade isso significava deixar aquele vaso como estava, enfiar toda minha vida nesta mala, pegar o primeiro trem e... Você sabe como são essas coisas. Ou pelo menos tem cara de saber.